quinta-feira, 26 de março de 2015

Oratório popular






Pequeno oratório popular, que poderá ter pertencido a uma qualquer casa privada. À sua volta congregava-se a família para os momentos íntimos de oração. Poderia ocupar o espaço do quarto, mais recolhido,  ou estar exposto em lugar de honra da casa. Comparativamente aos grandes retábulos das igrejas barrocas que foram, possivelmente, a sua fonte de inspiração, este, pelo seu cariz particular, apresenta proporções singelas.
Saído das mãos de um artesão anónimo, talvez resultante de encomenda sujeita ao gosto e poder económico do seu possuidor, foi executado numa única peça: mede 66 cm de altura por 27 cm de fundo.
É uma estrutura de pousar ou pendurar numa parede e destinava-se a abrigar os santos, especialmente os da fé familiar que compunham o cenário religioso dedicado à sua veneração.



Apresenta uma estrutura por andares, encimado por uma rosa esculpida em profundidade. Na base, um anjo de asas alongadas, suporta o peso da composição. A face, ainda relativamente bem conservada, revela, no delinear amendoado dos olhos, uma possível (?) influência oriental




O nicho principal, bem esculpido na espessura da madeira, configura um altar com uma peanha ladeada por duas volutas. A toda a sua volta podemos observar elementos vegetalistas, entalhados de forma minuciosa. Conferindo-lhe alguma profundidade, esssas volutas convergem para o interior, como que chamando a atenção para a imagem que estaria em exposição.






No segundo andar, dois pequenos altares,levemente recuados, apresentam-se com arcos de volta perfeita, perfazem uma composição simétrica e de decoração mais simples,  como que dando realce ao altar principal.



Dada a sua exiguidade, é natural que pudessem ter tido expostas pequenas imagens de marfim, cuja cor ressaltaria do colorido da sua pintura.

Para que refulgisse em toda a sua beleza, colocaram-se algumas imagens nos nichos, escolhidas unicamente pelas suas dimensões. Não se coadunam nem com o estilo, nem provavelmente com a época. Um Menino Jesus de Malines e duas imagens que, possivelmente, integraram uma composição do Calvário.







quarta-feira, 11 de março de 2015

Um casamento feliz...

Um casamento feliz...



Há tempos, num momento de zapping pelas imagens que tenho  em arquivo, deparei com este pires que me encantou: pelo desenho e pelas cores. Ainda o Luís não tinha mostrado a sua bela chávena e feito a sua atribuição segura à fábrica de Santo António do Vale da Piedade. Após a sua publicação, surgiu-me, então, a ideia para um post que se adaptasse ao fim que me propunha: um casamento feliz...  uma forma para o seu pé...enfim ...  um pires para a sua chávena. 
Desde finais da década de oitenta do século passado, mas progressivamente ganhando terreno e impondo-se pelo contributo que traz ao estudo da nossa produção cerâmica, a arqueologia urbana torna-se uma mais valia para o estudo da nossa faiança, pela clarificação e ajuda que avalizam  uma atribuição segura e inequívoca  às respectivas fabricas das peças recuperadas nas escavações.
Foi o caso da chávena do Luís e deste pires que, perdido e triste, andava sem conhecer a olaria do seu nascimento. 

É um facto que só se pode fazer uma atribuição indiscutida se as peças  tiverem a marca bem estampada e evidente. Por maior que sejam as nossas inclinações e (in)certezas (pasta, vidrado, paleta cromática, ornamentação, formato ...) as filiações são difíceis. Mesmo os grandes conhecedores e especialistas encontram dificuldades nesses procedimentos. Foi o caso deste pires que integra o acervo do MNSR, o qual Rafael Calado, que tive o privilégio de conhecer, atribuiu interrogativamente a Viana, como se pode observar pelo ponto de interrogação aposto.



Um casamento feliz. Quão bem ficariam, lado a lado, estas duas peças, provenientes das mãos habilidosas de artesãos de Santo António do Vale da Piedade. Embora a decoração seja aproximada, existem pequenas alterações, que nos transportam a pintores diferenciados. Mesmo assim, o conjunto seria magnífico e não destoaria numa vitrine, ocupando o lugar de honra.

Colecção particular
Chávena do Luís


Laura Cristina Peixoto de Sousa "A fábrica de Santo António do vale da Piedade, em Gaia: arquitectura, espaços e produção semi-industrial oitocentista".

velhariasdoluis.blogspot.com